quarta-feira, 20 de abril de 2011

DIÁRIO DO ATOR - Priscila Souza

Peça: "Ignácio&Maria"
Autor: Nara Mansur
Atriz: Priscila 
Data: 18/04/2011
Início: 14h10min 

Cheguei descontente no ensaio. Em plena segunda-feira, eu estava com preguiça, cansada fisicamente e mentalmente e sonolenta. Aos poucos fui me concentrando no meu corpo - caminhando pelo espaço. Segunda tarefa era conduzir a caminhada por diferentes partes do corpo. Me senti irritada, esse exercício é complicado, quando se quer pensar na realização. Mas depois de certa concentração e experimento entrei em um estado que chamo aqui de “pira” – conexão total de corpo, mente e espírito. É quando parece que meus pensamentos param e meus monstros saem – fluem por meio de meu corpo pelo espaço. 

Depois escolhemos cinco ações retiradas da peça para executar separadamente. Conforme as ações ganhavam vida e seqüência, Carlos colocava várias músicas diferentes. Chegou a um ponto que estava no estado de “pira” novamente. Estava ensopada de suor, mas zero de cansaço. Meu corpo pedia mais, ansioso por se libertar de barreiras visíveis impostas no meu dia-a-dia. Próximo exercício foi criar cinco ações retiradas do texto para fazer no parceiro. No início foi complicado realizar em um corpo que não é o meu. Mover músculos, ossos e pele que não é minha, me gerou uma sensação de estranhamento e curiosidade. Repetir as ações foi maçante, mesmo porque memorizar não é meu forte. Depois que cada um havia decorado as ações criadas pelo o outro. Fazíamos essas alternadamente com as outras cinco ações do exercício anterior. Novamente havia músicas nas execuções. Conforme fomos nos familiarizando, criamos brincadeiras com as ações a partir da experimentação mútua dos movimentos. Até que chegou a um ponto que estava na “pira” de novo, mas desta vez com o Ricardo junto – na mesma energia. Neste momento senti que estávamos prontos para atuar. Se agirmos no palco com a mesma entrega da qual estávamos no final deste exercício, garanto que será verdadeiro. Vivo.

Comparo este ensaio como um pedaço de queijo. Cada tarefa executada representou uma fatia deste. Porém entre os cortes a energia foi perdida, ou melhor, amenizada. 

Como fazer para que a energia flua sem cortes?

terça-feira, 19 de abril de 2011

DIÁRIO DE DIREÇÃO - "Ignácio & Maria"

Peça: "Ignácio & Maria"
Autor: Nara Mansur
Elenco: Priscila Souza e Ricardo Goulart
Data: 18/04/2011
Início: 14h10min


No ensaio de hoje eu estava anormalmente "elétrico", e isso me tornou mais presente, isto é, mais participativo na criação deles... o que não sei se é bom, porque temo por acabar criando com eles, enquanto creio que nesse primeiro momento eles devem ter toda a liberdade criadora e sentir-se dessa forma.

Minha intenção hoje era criar uma relação que não me parecia suficientemente criada ainda: texto x artistas. Haja vista que nas semanas anteriores, trabalhamos com mais intensidade e atenção a relação entre os dois artistas, que não serão tratados como "personagens" e sim "portadores de discurso", pois não estamos buscando acentuar ou criar uma fábula a partir da peça, mas acentuar a performatividade que há na teatralidade imanente desse texto, dito dramático.

Pedi a princípio, que os atores não iniciassem os ensaios  (estudo da cena) buscando energias em mim ou no aquecimento, mas trazendo energia. É o princípio do estímulo e do melhor aproveitamento do tempo. Afinal, se chegarmos no estudo da cena com a preguiça que nos é peculiar, demora um tempo razoável para entrarmos numa vibração de criação e num estado de prontidão que nos permita render, e para uma peça que se ensaia uma vez por semana,  não podemos nos dar a esse luxo, razão pela qual, devemos vir aquecidos e preparados.

Esse alerta já foi levantado pela segunda vez, mas a partir do próximo ensaio não será mais dado e, sim aplicado.

Portanto, hoje fizemos um aquecimento mais para trabalhar a nossa atenção/concentração e ativar o corpo. Temo que os atores encarem o aquecimento como um processo de "esquecer o mundo lá fora" e "concentrarem-se num texto ou ação teatral".  Na realidade, o que mais me interessa não é a alienação do mundo que o ensaio possa provocar ou dar a entender à alguém, me interessa muitíssimo tudo o que eles trazem, desde a mágoa oriunda de uma briga ou situação particular à raiva que uma topada numa pedra minutos antes de se chegar no ensaio possa ter-lhes provocado. Tudo isso é material criador, é combustível deles. Se pensarmos o aquecimento como preparador do estado de prontidão e abertura para a criação, nada mais justo do que pedir que eles não esqueçam as contas à pagar, os encontros e desencontros que tiveram... e, ao contrário de esquecer, que canalizem para o corpo, para a expressividade e pro jogo, todo material emocional, energético e sensorial que lhes estiver "atacando" naquele momento.
No primeiro exercício, simplesmente precisavam caminha ativamente pelo espaço, procurando um ponto na parede e respondendo à 3 comandos dados por um cabo de vassouras no chão. 1 toque equivale a abaixar-se, tocar o chão e continuar, 2 toques, equivale a pular e seguir caminhando, 3 toques equivale a deitar-se e continuar caminhando. O exercício busca concentração e percepção do outro ao ponto de acharem um ritmo em comum, pulando, abaixando-se, e deitando-se em sincronia. Feito isto, partimos para o segundo exercício, continuar caminhando até um determinado ponto na parede e, ao alcança-lo, no fugaz momento de buscar outro, que deixassem o impulso para o novo movimento partir de outra parte do corpo que não mais os olhos, deixando com que reverberasse no corpo esta nova "lógica" start do movimento. Na continuação deste exercício, avisei que o impulso gerador do novo caminhar partiria aleatoriamente, sem mais precisar alcançar o ponto na parede... esse impulso seria agora aleatório, caótico e sem controle. Pedi apenas para usufruirem aquilo que seus corpos estavam lhes "ensinando" mostrando. E permitissem um tipo de movimentação pelo espaço que não fosse convencional e que explorasse os planos e, portanto, o próprio corpo. Me pareceram exaustos, pelo menos suaram muito.
Numa segunda etapa, pegamos o texto, cena 3 e pedi a eles que retirassem 4 ações implícitas ou explicitas e as transformassem em movimento. Cada qual seria conectada por uma transição criada por eles mesmos. Realizada a escolha, sugeri que caminhassem pelo palco até encontrar um local que lhes fosse confortável ou simpático, lá parassem e explorassem tais movimentos, repetindo-os a medida que completassem a sequência. Num primeiro estágio, deixei-os trabalhando em silêncio e com pouca luz, para que conectassem-se em com seus corpos, ampliando sua capacidade expressiva, ou pelo menos de fazer ecoar por aquelas "carcaças" a criação daquelas mentes. Depois, adicionei umas músicas, como elemento externo estimulante, e para ver como reagiriam, englobariam e se apropriariam dos elementos fornecidos pela música (melodia, ritmo, sentimentos ou emoções). Me pareceu que passaram a dar melhor acabamento aos movimentos (como numa dança), e conforme a música, a dar maior intensidade à determinadas emoções presentes ou não nos movimentos. Exemplo, num movimento de estapear, com uma música punk, a Priscila parecia mais expressiva, enquanto numa música mais romântica, certos movimentos do Ricardo ganhavam mais valor, e o contrário também acontecia, isto é, músicas que não "colaboravam" ou dialogavam com o movimento pareciam incomodá-los. Algo muito bom! Sinal de que são humanos, sentem, e buscam expressar tanto o que lhes é agradável quanto o contrário.

Depois pedi para conversarmos um pouco (na realidade sempre conversamos muito, mais para saber o que acham do que para avaliar o que pensam, menos ainda para dizer se estão certos ou errados). Colhi as impressões deles, e afirmaram o que escrevi acima. Na realidade não iniciei o exercício esperando isso, mas apenas esperando ver o que acontecia, afinal este é um processo criativo colaborativo e, não "indutivo", do contrário, estou induzindo ao resultado, e me importa o que eles traze dentro da sua espontaneidade, verdade e desejo.
Por último, pedi que buscassem outras 5 ações, agora na cena 4 e aplicassem tais movimentos um no outro, intercaladamente, isto é, o Ricardo começou manipulando o corpo da Priscila de modo que ela fizesse o primeiro movimento que ele criou, em seguida ela moldava os movimentos do Ricardo conforme o primeiro movimento que ela criou e assim por diante. As primeiras repetições eram aprendizagens e, portanto, truncadas, rígidas, sem ritmo e fluência, mas a medida que iam repetindo, corpoirificando e aprendendo os movimentos, começavam a fazê-los com mais liberdade. Quando chegaram nesse estágio, pedi para que o criador do movimento não mais manipulasse o outro, mas criasse apenas um movimento de comando que indicasse ao outro o que deveria fazer. Por fim, após outras tantas repetições, solicitei para que o criador dos movimentos fizesse os movimentos da cena 3 (que havia criado isoladamente) enquanto o parceiro estivesse executando os movimentos (oriundos da cena 4) que nele haviam sido "impressos".
Repetiram por mais de uma hora, passando pelo estágio do esgotamento mental, emocional e por fim, entrando numa espécie de ciclo meditativo do movimento em que ele brotava fluidamente e, onde os atores apenas usufuiam. 
Durante todo esse processo, deixei algumas músicas, e conforme iam ganhando fluência naquela linguagem, as músicas mais adequadas (me pareceu) foram umas composições próprias para a meditação. Confesso que nesse estágio eu estava todo arrepiado, numa espécie de gozo estético, admirando as evoluções dos dois. A leveza, a beleza, a graça, enfim, nem sei como adjetivar... era apenas delicioso vê-los.
No final, conversamos um pouco sobre essas etapas, sobre o texto que começa a querer nascer, e sobre um processo semelhante ao corpo para trabalhá-lo, isto é, da mesma forma que a repetição de movimentos descola o gesto da mente e o cola em qualquer canto subconsciente, o texto também precisa ser repetido ao ponto do esgotamento, da banalização para ser corpoirificado, ganhar a profundeza das carnes deles, e quem sabe, emergir futuramente numa erupção de novos significados e sensações.

Pedi para que decorassem toda a cena 2 e dei-lhes o próximo ensaio de folga para dedicarem-se a isto. Pedi que para cada fala, buscassem uma foto. A princípio, quero que eles sintetisem e apropriem-se desses signos (textuais e visuais), o que surgir a partir daí, é mais que lucro, é festa. 

É isso, por enquanto. Ah, olha que delícia:

<...>
IGNÁCIO : Todos os dias saio à rua com o mesmo plano que não cumpro, que não termino e me pergunto por quê?
MARIA : Por favor, não se vá.
IGNÁCIO : Não me vou.
MARIA : Abraça-me.
IGNÁCIO : Te abraço. 

MARIA : Perdoo todos os teus sonhos.
<...>


Agora me responda, cabe um personagem aqui? uma fábula? Não cabe... não, não... 

Orgástico!

P.S.: vejam as fotos do ensaio na coluna da direita.

DIÁRIO DO ATOR - Ricardo Goulart


Peça: "Ignacio&Maria"
Autor: Nara Mansur
Ator: Ricardo Goulart
Data: 18/04/2011
Início: 14h10min


Acho que por ser segunda-feira, cheguei um pouco indisposto e “lento” no último ensaio. Começamos caminhando pelo espaço. Aos poucos fui conseguindo me desconectar das coisas que não estavam dentro da sala e me conscientizando do meu corpo. Continuamos caminhando, mas a partir de um determinado momento deveríamos responder aos códigos que Carlos nos fornecia: quando ouvíamos o barulho de uma batida no chão, deveríamos encostar a mão no tablado; duas, deveríamos pular e três, deitar; sempre ativando a atenção e buscando o equilíbrio, tentando executar os movimentos em sincronia com o parceiro. Havia, ainda, mais dois códigos: com o barulho de uma palma deveríamos parar por completo e aumentar ou diminuir a velocidade da caminhada conforme nos era pedido.

A seguir caminhávamos até certo ponto da sala e deveríamos nos deixar guiar pelo impulso dado por alguma parte aleatória do corpo. Esse tipo de exercício sempre me parece muito chato e interminável enquanto estou racionalizando, enquanto penso qual vai ser a próxima parte a me impulsionar. Felizmente, eu consigo me entregar razoavelmente rápido e aí o exercício passa a fluir. Meu rosto escorria de suor, de uma forma como nunca tinha visto antes, e só fui perceber quando o exercício terminou.
A partir de ontem, nos próximos ensaios, vamos trabalhar nossa familiarização com o texto. No primeiro exercício, dessa fase dos ensaios, Carlos pediu que lêssemos a cena 3 e escolhêssemos cinco verbos para corporificá-los, criam um movimento de ação para cada um. Depois, a cena escolhida foi a 4 e os movimentos deveriam ser feitos no corpo do parceiro. Os dois exercícios foram feitos com repetição e música. Num dado momento, não poderíamos mais “guiar” o corpo do parceiro na execução dos movimentos, mas dar sinais para que ele sozinho fizesse os gestos escolhidos para representar os verbos retirados da cena 4. Finalmente, já havíamos “decorado” os cinco movimentos, então deveríamos intercalar com os cinco primeiros da cena 3.
Algumas músicas tocaram enquanto fazíamos os movimentos e elas interferiram na forma como eles eram executados. No meu caso, umas interferiram positivamente, outras nem tanto. Estes dois exercícios também só devem ser racionalizados o suficiente pra se memorizar os gestos, porque se não perde o sentido. Aliás, não ganha sentido. Quando parei de pensar na sequência dos gestos, me senti incorporado a eles, como se esses movimentos, por si só, guiassem meu corpo. Por fim, lemos um trecho da cena 3 e escolhemos e experimentamos movimentos que representavam cada uma dessa falas.
O último ensaio pode ser definido como o início de uma proximidade, de uma relação, com o texto, não só intelectualmente, mas fisicamente. "Ignacio y Maria" começa a ganhar corpo.

domingo, 17 de abril de 2011

DIÁRIO DO ATOR - Tobias Nunnes

Peça: "Canção de ninar para um anarquista"
Autor: Jorge Diaz
Ator: Tobias Nunnes

Data: 16/04/2010

Novas fórmulas, novas estruturas e novas percepções. Segundo ensaio/estudo com Vanessa, e algumas descobertas.

O dia não era dos mais favoráveis, a imensa vontade de estar deitado, quieto e possivelmente dormindo era maior que qualquer outra. Um estranho vazio, suscetível ás minhas próprias emoções, desestabilizaram e aguçaram ainda mais o lado sensível. Algumas lembranças e associações. Tudo se dissolveu no tranco, logo de início, antes mesmo de qualquer aquecimento, diferente do encontro anterior, o que colaborou para que qualquer mal estar se dissipasse, foi válido; concentração e entrega favorecidos. No decorrer das repetições, liberdade e bem-estar. As palavras e o personagem como um todo permitiram certa leveza e disposição. A relação com Vanessa é colaborativa e estimulante, talvez em função de segurança maior com o texto de minha parte. O que permite inspiração. E ampla abertura da parte dela á críticas, formulações e também descobertas. E a maior descoberta nesse dia é fazer do inesperado uma revolução. Um sorriso ao fim de tudo se abriu, a sensação de "consegui" e "posso muito mais" cravada no corpo - benéfico.
A direção instigante, o espaço confortável.

Destaco como ponto forte a transformação de uma peça em processo quase finalizado, ter de necessariamente reerguer novas estruturas na tentativa de se beneficiar das adaptações desafiantes que lhe são impostas para que fique devidamente e finalmente pronta!

Com histórico marcante e não menos interessante, há condições de torná-la um ótimo e ao mesmo tempo denso jogo de diversão.

Vanessa tem possibilitado uma nova visão.
Anna Lia deixa uma saudosa sensação. Ambas estarão em cena.
Carrego comigo.

"Diga que bom sim, se você quer... nada acabou diga sim pro que vier. Que é babaquice segurar. Não , não dá"

quinta-feira, 14 de abril de 2011

III CONGRESO DE TEATRO CONTEMPORÁNEO - PROGRAMA



"MIÉRCOLES 27

9am
MESA 5: POÉTICAS GRUPALES
Intercessores, a ponte de Deleuze entre a técnica e a prática no teatro colaborativo - Carlos Eduardo Da Silva
Teatro colaborativo: grupalidad y poética del siglo XXI - Diego La Hoz"


Essa pesquisa realizo no L.A. CHAMA sob orientação do Prof. Dr. Rodrigo Garcez junto ao PACT (grupo que tem um post aqui no blog). Só falta a PRAE (Pró-reitoria de assuntos estudantis) assinar minha ida.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

DIÁRIO DO ATOR - Ricardo Goulart

Peça: "Ignácio&Maria"
Autor: Nara Mansur
Ator: Ricardo Goulart
Data: 04/04/2011
Início: 14h05min

Começamos o ensaio do dia 04 de abril com uma conversa sobre algumas ideias iniciais que surgiram a partir de elementos disparadores que estamos usando para a concepção das cenas. Pri havia levado, no ensaio anterior, quatro fotos e eu, duas músicas. Não tenho aqui as fotos, mas as músicas podem ser ouvidas nos links abaixo.


Escolhi essas músicas, primeiramente, por terem forte relação com Cuba: a primeira é interpretada por uma cantora cubana e fala sobre a emoção causada pelo encontro do ser idealizado. Para mim, Maria sentiu essas mesmas coisas quando conheceu Ignácio e, talvez, a própria música até tocasse durante esse encontro; a segunda é interpretada por uma descendente de cubano. Tudo bem, a autoria da canção é brasileira, todo mundo sabe, mas retrata o desejo de alguém que recorre aos sonhos para estar perto daquele (a) que se exilou. Por não ter interesse de sair de seu país, Maria faz o mesmo. No final da música a cantora recita um poema de José Martí (político, pensador, jornalista, filósofo e poeta cubano), que diz o seguinte:
Cultivo una rosa blanca
En Junio como en Enero,
Para el amigo sincero,
Que me da su mano franca.

Y para el cruel que me arranca
El corazón con que vivo,
Cardo ni ortiga cultivo;
cultivo una rosa blanca.

Como no poema, Maria nutre por Ignácio um sentimento que ela julga ser bom, seja ele amigo ou inimigo de seu povo, esteja ele longe ou perto.

Após a conversa, foi feito um exercício de exaustão e fixação de texto, em que líamos algumas cenas alternando a velocidade e empregando um sentimento (por exemplo, raiva) de acordo com o ritmo. Esse sentimento deveria se intensificar ou diminuir com a velocidade da fala. Em seguida, a exaustão foi física num exercício em que saíamos de lados opostos até o encontro no meio da sala, onde girávamos segurando o braço um do outro, continuando posteriormente a caminhada ao outro lado da sala. A velocidade ia aumentando de acordo com o estímulo de Carlos. Como no exercício anterior, os movimentos foram se tornando automáticos à medida que a velocidade se intensificava e eu ficava cansado. Depois disso, criamos seis “fotos vivas” a partir das imagens apresentadas por Pri.

No próximo exercício deveríamos fazer cócegas no parceiro. Pri é bastante sensível a isso, então não foi difícil fazer com que ela se contorcesse ou sentisse algum tipo de desconforto nesta atividade. No meu caso, acho que Pri continuou desconfortável ou, pelo menos, inconformada porque tenho dificuldades em sentir cócegas. Terminado o momento das cócegas, deveríamos proporcionar momentos de outras formas de desconforto e até dor no parceiro. Ambos começamos bastante tímidos ou temerosos em relação ao outro, mas com a repetição do exercício a tarefa foi se tornando mais fácil. Esses exercícios, sem dúvida, tem contribuído (e muito) para uma busca e utilização da verdade na cena afastando-nos da representação. Além disso, tem influenciado também na minha relação com Pri, no que diz respeito à aproximação e confiança. Isso seria positivo em qualquer relação, mas é em especial na nossa porque nos conhecemos há pouco tempo.

domingo, 10 de abril de 2011

DIÁRIO DO ATOR - Priscila Souza

Peça: "Ignácio&Maria"
Autor: Nara Mansur
Atriz: Priscila 
Data: 04/04/2011
Início: 14h05min 

A primeira atividade do ensaio foi ler algumas cenas alternando a velocidade e o sentimento da leitura. Conforme líamos mais rápido, o grau de dificuldade aumentava. Este é um excelente exercício para decorar falas, do qual eu não conhecia.

Segunda atividade: caminhar cada vez mais rápido em direção ao parceiro girar e depois retornar a parede. Esta é uma tarefa de exaustão física e de concentração também. À medida que a velocidade aumentava, tontura e disciplina diminuíam.

Terceira atividade foi provocar sensações de desconforto e constrangimento no parceiro. A primeira vez durou um minuto, na segunda dois minutos e a terceira e última três minutos. Essa sem dúvidas foi a melhor tarefa do ensaio. No primeiro tempo, a ansiedade contribuiu para superestimar a minha vulnerabilidade e recato. Sensação de cócegas a quem assiste parece divertido, mas para quem sente é quase insuportável dependendo da duração e intensidade. Quando o Ricardo me mordeu, doeu bastante, mas resisti à vontade de gritar (sinal que foi pré-estabelecido como forma de parar o exercício), porque de alguma forma adquiri confiança nele e sabia instintivamente que não estava em situação de perigo. Isso quer dizer que o que fizemos ou sentimos foi de mentira? Eu passei a semana inteira pensando sobre. Cheguei à conclusão que não. O fato de o outro não oferecer perigo não significa que não vivenciei aquilo. Ricardo realmente, me mordeu, abaixou minhas calças, fez cócegas e etc. Isso tudo me incomodou. Bem, talvez eu esteja sendo pouco clara. Vou descrever a terceira parte do exercício para explicar melhor. Na terceira vez onde a realização teve uma duração maior, pareceu muito mais rápido. Porque à medida que fomos nos conhecendo por meio do exercício, adquirimos tanta confiança que nesta última vez estava implícito na nossa fisionomia: faça o que quiser comigo. Então, não é porque é falso que não gritamos e sim por confiança no outro.

Quando foi a minha vez de fazer no parceiro. Estava mais confortável do que no ensaio passado. Provocar sensações de desconforto no Ricardo, me fez estar desconfortável. Mas desta vez de uma maneira diferente, arrisco em dizer até que de um modo bom. Eu brincava com ele e vice-versa. 

Depois para finalizar, encerramos com o relaxamento e fizemos uma foto viva. 

Conclusão que obtive. Quando Carlos me falou que o que interessa é o que se cria por meio do jogo com todos os atores envolvidos na cena, eu não me dei por satisfeita. Precisava de provas práticas de que assim realmente funciona melhor. Fui ensinada a pensar e ensaiar a cena em casa sozinha e depois realizar com o restante do grupo. Criar em conjunto é muito mais divertido e garante uma sintonia e vivência real em cena.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

DIÁRIO DE DIREÇÃO - "Ignácio & Maria"

Peça: "Ignácio & Maria"
Autor: Nara Mansur
Elenco: Priscila Souza e Ricardo Goulart
Data: 04/04/2011
Início: 14h05min

Muito bom ensaio, mas o melhor lugar para se olhar o céu é do topo da montanha! Portanto, vamos continuar subindo, sem acomodarmo-nos!


Vamos às impressões deste dia:
Começamos conversando sobre o texto, por intervenção da Priscila. Ela começou a apresentar algumas idéias relativas ao texto, as quais achei excelentes. Não apresentarei as idéias aqui, mas para dar-lhes uma idéia, as soluções dela   simplesmente deram uma cara a peça. Isso porque esta peça é, honestamente falando, muito difícil, a começar por suas linhas serem puro poema. Vejam o exemplo das falas abaixo:
(...)

IGNÁCIO : O mundo resplandece se sorries comendo uma laranja.

MARIA    : As laranjas existirão para que ele me veja comê-las. Limparei a casa, para quando me visitar. Mudarei as datas dos jornais e almanaques.

IGNÁCIO : O século se acaba, o milênio se acaba. O século começa. O milênio começa. Adiantarei os computadores, mudarei para que o último dia não seja 31 de dezembro, mudarei as marcas dos carros, falsearei minha voz e meu corpo para ser todos os amantes que Maria precisa.
MARIA    : Quero amanhecer ensimesmada, nervosa, sem fome, com todos os homens que amei e amo perto da minha cama; esperando o sinal para saber quem é o meu eleito, qual deles coará o café e arrumará a cafeteira; quem fechará a presilha do meu sutiã.
(...)

Como se comportar diante de um texto assim? É um ótimo começo, acho que Lehmann deu algumas pistas no seu Teatro Pós-dramático, quando eleva os demais elementos constitutivos da peça ao mesmo patamar de importância do texto, e chama tudo isso de parataxe. Isto é, talvez seja importante encarar o texto nesse caso, não como a camada semântica, de significação, mais importante. Daí, buscamos construir imagens, movimentos, sons e expressões "inspirados" pelo texto. 
Fundamentada, sem saber, em tudo isso, a Priscila trouxe soluções que suportam a parataxe e dialogam com os demais elementos da cena de igual pra igual. 
O Rick, aperfeiçoou algumas idéias, sugeriu outras tão boas quanto e assim, posso finalmente dizer algo que pelas minhas palavras à você, caro leitor, sei que propositadamente ainda não transparece, mas, temos uma peça em andamento. As cenas são menos obscuras e mais definidas, permitindo um ensaio mais direcionado.
Em seguida, fizemos uma leitura da cena 2, em velocidade crescente, para que os atores comecem a se acostumar com o texto, o qual ainda não pedi para que comecem a decorar. Fizemos alguns um exercício para melhorar a expressividade, isto é, partindo da leitura, onde o trabalho é essencialmente cerebral, partimos para o corpo para ver a diferença de se incluí-lo no jogo. Foram esses exercícios:
1. ambos estavam em lados opostos do espaço, e tinham que se tocar, girar e continuar sua rota, na direção de mudarem de lado, repetindo o procedimento em velocidades cada vez mais lentas.
2. cócegas, onde cada um ao seu tempo, deita no chão, e recebe cócegas do outro, podendo tudo, menos falar ou impedir a prática;
3. desconforto, onde cada qual ao seu tempo, de pé, pratica as coisas mais desagradáveis e desconfortáveis no parceiro, dentro de um tempo limíte, onde o jogo se encerra quando alguém gritar ou quando o tempo se esgotar. 
4. dor, onde cada qual ao seu tempo, de pé, provoca dor no parceiro.

Observações: sinto que ambos podem entregarem-se um pouco mais, isto é, ainda os vejo tímidos, sem dominarem a cena... faltam gritos, gargalhadas, gestos e atos expansivos; mas antes de "entregarem-se" falta se "abrirem", eles precisam expressar com mais frequência o que sentem, ou o que criam, isto é, se não sentem dor, mas estão criando a situação desta, isso precisa ficar claro em cores gritantes... espero estar sendo entendido. Bem, com relação ao exercício 2, 3, e 4, a Priscila levantou algo de muito interessante: que ambos não provocavam dor de verdade, ou desconforto... que "parecia ser de mentirinha". Algo expressivo para a reflexão.
Minha busca a partir de agora é no sentido de descobrir meios de fazê-los se abrirem ainda mais, e, portanto, expressarem-se cada vez com mais liberdade, sem o medo de estar parecendo "ridícula" que a Priscila tanto tem, ou o pesado auto-julgamento que o Ricardo emprega a si mesmo. Enfim, preciso criar jogos nos quais eles apenas vejam "que podem", para que "se acostumem" e passem a "empregar a experiência" apreendida, pois não posso criar um jogo por ensaio para eles se soltarem, precisam se acostumar futuramente com essa realidade que faz parte de fazer o ensaio render.
Por fim, pedi para que transformassem as fotos que trouxeram, buscadas e inspiradas na peça, e transformassem em esculturas humanas ligadas à alguma cena específica, à escolha deles. Depois de 7minutos, pedi para que se deitassem no chão, e, ao som de Il postino, sentissem o corpo. E levados por alguns convites que os fazia, pedi para que começassem a ativar parte por parte, até que em determidado momento, ambos estavam dançando, e ao meu pedido, a dança os levou para a posição das esculturas que criaram, como que dando dinâmica as figuras estática iniciais. Me pareceu que ambos entregaram-se nesse exercício. Talvez o jogo e a sensorialidade da música/dança sejam bons caminhos, ambos estão ligados com o corpo, é nele que quero chegar, para ver a visceralidade e organicidade tanto do Ricardo quanto da Priscila.



A tarefa para casa era para que trouxessem elementos os quais pudem incluir nos exercícios de desconforto, cócegas e dor. Estes exercícios são muito próprios quando se busca preparar os atores para se auto-estimularem na cena, e por falar nisso, gosto muito dos estímulos da Priscila sobre o Ricardo, essa frase dá a impressão de que a atitude dela é bom só para ela, quando o conjunto da obra que é ótimo, pois quando ela o estimula, seja por um tapa ou pegando no pênis dele, como ela fez, ele reage, e tão verdadeiros ou corajosos quanto esses estímulos é a reação dele, profundamente espontânea, ou seja: orgânica. Parabéns pros dois, espero que cresçam nessa direção. O jogo cresce quando crescem os estímulos (e reações a estes estímulos) vindos de ambas as partes.


Com relação à estas reflexões/observações, não me levem ao pé da letra... só o quão a sério for necessário para se construir algo bom.

Postarei fotos deste ensaio no fim de semana.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

DIÁRIO DE DIREÇÃO - "Canción de cuna..."

Peça: "Canção de ninar para um anarquista"
Autor: Jorge Díaz
Elenco: Anna Lia e Tobias Nunnes
Período: Janeiro e Fevereiro/2011
Início: 09h00min

Tive a honra e felicidade de ensaiar praticamente todas as semanas de Janeiro e Fevereiro com esse elenco maravilhoso. Muitas semanas, mais de um ensaio.
Chegamos a níveis de melhoramento dramatúrgico e da cena muito além do esperado. 
Os ganhos foram tantos que não dá pra escrevê-los todos aqui. 
Anna Lia e Tobias me deram a honra de chegar com eles à lugares de si próprios que somente eles conheciam.
Infelizmente, por razões de ordem profissional, a Anna vai viajar, e tivemos que achar outra atriz. 
A Vanessa irá substituí-la, e confesso que na primeira leitura me enchi de alegria e esperanças, porque ela desenhou uma Rousaura que me estimulou muito. 

Espero que o Tobias esteja tão otimista quanto eu. E que possamos construir algo muito vivo, nós três!

Boa sorte Anna!
Bem vinda Vanessa! 

DIÁRIO DE DIREÇÃO - "Ignácio & Maria"

Peça: "Ignácio & Maria"
Autor: Nara Mansur
Elenco: Priscila Souza e Ricardo Goulart
Data: 28/03/2011
Início: 14h30min

Hoje iniciamos mais um dia de ensaios cujo grande objetivo centrou-se na criação de uma relação entre os atores/jogadores e na fundamentação da peça que surgirá.
Quando falo "fundamentação", me refiro à necessidade que tenho de estimular os atores a terem uma escolha ética quanto a peça que estão criando. Ético aqui utilizado enquanto escolha consciente dentro de um contexto sócio-político-cultural, conforme nos apresenta Bakhtin (vide "Para uma filosofia do ato responsável"). Entendo como de suma importância que os atores estejam conscientes da importância dos seus atos e, na prática, isso significa: querer algo com a peça e direcionar este querer (esta intenção) à uma realização cênica; dar objetivo e aliar este objetivo interno à materialização da peça.
De início, propus um aquecimento corporal de aterramento, que é um exercício muito utilizado na commedia dell'artes para melhorar a movimentação dos Zanni. Esse exercício foi utilizado para aquecer, ativar a musculatura física e sensorial e testar uma certa desconfiança que tenho de que Ricardo e Priscila chegam no limite psicológico antes do corpo, ou seja, antes mesmo de eu me cansar (olha que tenho 98kg) eles já estão dizendo: "ai, cansei!". Especialmente a Priscila. E isso vai contra o estado de prontidão e disponibilidade, que é aquela marca mínima adequada que o ator tem que ter para fazer o ensaio render: estar pronto pro que der e vier e disponível para fazer tudo o possível. Vou continuar observando e tentar quebrar essas pequenas barreiras sem que percebam. Acho que a chave para isso está muito mais em mim do que neles.
Depois fomos caminhar pelo ambiente para atingir um estado de atenção que eu não estava captando em ambos. Como fazer isso? Simples: caminhar até que não se escute os passos pela sala, este foi o comando. Mas creio que não surtiu efeito algum. Retomaremos adiante.
Em seguida fomos para uma massagem que culminaria com uma manipulação corporal do outro. Ambos estavam bem entrosados e concentrados na sua ação. Ainda os percebo arriscando pouco, e isso significa: pouca busca do "diferente", do fazer de outra forma que não aquela aliada ao senso comum. Evidentemente que quanto menos se arrisca, menos se estimula, e quanto menos estímulos, mais fraco o jogo. É importante e interessante observar que no início de cada exercício os atores chegam ao seu esgotamento muito rapidamente, indício de que ainda estão se acostumando com ele e não observando o quanto de possibilidades possuem. Exemplo: na massagem, massageavam rápido, toques quase ansiosos, angustiantes, apressados as vezes, claro que assim ninguem "curte" a proposta adequadamente; o ideal é, nesse caso, tocar lentamente, usufruir do contato direto e nem sempre tão próximo com o outro, é buscar variar ritmos, velocidades e formas, mas quando se faz algo rápido, você não o sente com o intensidade adequada nem verifica as possibilidades que teria a disposição. Solução pra isso? Repetição! Fizeram o exercício 3 vezes, sem o saberem (ou melhor, agora sabem). E da última vez que estava manipulando-se, os toques, as interferências já eram muito mais estimulantes e criadoras de imagens muito mais interessantes.
Em seguida, fizemos um exercício de olho no olho para criar um vínculo interno entre ambos também. Espero que tenham se enxergado, se ver é fácil, se enxergar, difícil! Mas ambos estão num entrosamento muito bacana. 
Gosto muito do quanto e como a Priscila surpreende o Ricardo com seus tapas, uma espécie de "petulância" (maravilhosa, leia-se de passagem) de quem enfrenta o desafio ou tenta buscar uma forma nova. Isso é excelente. Por seu lado, fico muito satisfeito com essa motivação para o Ricardo, ele merece engatar essa peça!
Conversamos em seguida sobre a motivação principal da peça. Percebi que ambos estavam lendo-a de forma romântica, o que não é ruim, mas é comum. Propus uma leitura mais às avessas, apresentando outra fundamentação para a peça. Espero que eles gostem e passem a ler a peça com olhos diferentes dos iniciais.  Não vou abrir aqui ainda do que falará esta peça, mas saibam que "amor", "política", "revolução" e "sonhos" são somente panos de fundo para aquilo que move o ser humano do berço ao túmulo.
A cena 1, 2 e 3 foi definida praticamente pelos 2. 
A Priscila trouxe excelente fotos que renderão ótimas imagens e cenas e o Ricardo trouxe uma foto muito boa e ótimas músicas.
Vou tentar colocá-las aqui.
Por hoje é só, estou satisfeito e refletindo sobre o que possa ser produtivo para o próximo ensaio. Tão logo tenhamos uma imagem geral da peça, começamos a brincar com a repetição dos ensaios. Por enquanto, assim que chegamos numa solução imediata, passamos pra cena seguinte.