sábado, 7 de maio de 2011

DIÁRIO DE DIREÇÃO - "Ignácio & Maria"

Peça: "Ignácio & Maria"
Autor: Nara Mansur
Elenco: Priscila Souza e Ricardo Goulart
Data: 02/05/2011
Início: 14h10min

Começamos o ensaio de hoje com alguns objetivos pré-determinados, o que não é exatamente uma premissa daquilo que procuramos com um "teatro colaborativo". Isto é, quando o "diretor" sai de casa em busca de um resultado específico, o processo está muito mais para o "induzido" que para o "colaborativo". Contudo, não consigo enxergar um processo "puramente" colaborativo, tampouco induzido, cada um dá e pede alguma coisa no jogo. Enfim, hoje, a parte indutória teve sua importância, pois eu queria trabalhar a corpoirificação/incorporação do texto pelos atores para que, em se absorvendo o texto, eles não o carreguem mais como um peso e tenham "espaço" mental e corporal para brincar... com o quê? Com tudo, inclusive e sobretudo o próprio texto.
Portanto, vendo o processo como uma sucessão de acontecimentos com fins em longo prazo, me dei ao direito desta manobra por hoje, e talvez mais algumas semanas até que Priscila e Ricardo estejam confortáveis com o texto e a vontade para brincar com ele.
Hoje esqueci a câmera fotográfica em casa, portanto não há registros visuais de espécie alguma para compartilhar com vocês. Por isso, vou tentar ser o mais descritivo possível.
Iniciamos o ensaio com uma massagem, porém o massageado tinha que dar o texto enquanto era massageado; objetivo? Que eles fossem relaxando fisicamente enquanto pudessem "vocalizar" o texto, e serem tomados pela agradável entrega física. Sinto, quando estou atuando, que os primeiros manuseios do texto são cercados de dúvidas sobre como "entoar", como "pronunciar", ou mesmo qual sentido imprimir numa linha qualquer. O que eu busquei nesse primeiro momento foi iniciar um processo de "des-solenizar" o texto, ele não é algo tão importante e solene neste primeiro momento para que eles se preocupem tanto em como dar-lhe "vida". Estão só no começo, e já é bom começar a desacralizá-lo, ou por outra, profaná-lo. Mas como pedir isso, sem pedir isso diretamente? Brincando, relaxando, experimentando.
Por tudo isso, o Ricardo ia massageando a Priscila enquanto ela evocava o texto da sua memória e o vocalizava sem preocupar-se num primeiro momento em dar-lhe forma fiel ao escrito pelo autor, ela apenas tinha que ir entregando o corpo ao relaxamento promovido pelo Ricardo e entregando o texto ao corpo relaxado. No fundo, eu queria que o relaxamento físico "contaminasse" o estado psico-emocional deles e reverberasse no texto em enunciação. Nada de pressão, nada de criar eventuais bloqueios. 
O exercício continua pelo tempo que se julgar necessário, deixei a Priscila repetindo umas 3vezes a cena 2, em seguida ela foi a massageadora e o Ricardo quem dava as falas. Não havia neste primeiro momento, contato verbal, isto é, diálogo. Ambos, quando massageados, davam as falas como se estivessem falando sozinhos.
Posteriormente a este exercício, voltamos a massagem, sendo que agora, após alguns minutos sendo massageada e enunciando a mesma cena, a Priscila começava a ter seu corpo manipulado e conduzido através do espaço pelo Ricardo. Ele deveria massageá-la tempo o suficiente (eu determinava este tempo pela observação, para que ele não se deixasse dominar pela ansiedade) e então ele começava a conduzí-la e manipulá-la na sala enquanto ela continuava a enunciar o seu texto. Começamos a adicionar elementos ao texto, movimentos não programados por ela (mas pelo manipulador/condutor) para que o corpo se entregasse cada vez mais e perdendo cada vez mais as resistências emocionais/musculares. O mesmo processo se repetia com o Ricardo. É importante dizer que sempre havia uma musica em baixo volume, algo tranquilizante, mas não o suficiente pra causar torpor.
Na sequência deste exercício, a massagem continuava, sendo que agora, o massageador também poderia causar estímulos mais fortes no massageado enquanto este enunciava seu texto. Esse estímulo poderia ser cócegas, dor, carinho, etc. E o massageado era, portanto, estimulado a deixar essas sensações reverberar na sua fala. Exemplo, se num determinado treicho, o Ricardo fizesse cócegas, a Priscila era estimulada a rir/gargalhar enquanto falava seu texto.
Por fim, pedi que colassem olhos nos olhos e começassem o primeiro diálogo entre eles, não foi muito produtivo pois, apesar do corpo e mente relaxados, o texto ainda não estava totalmente seguro. Este processo dura em torno de 1 mês.

Pedi, como dever de casa, que ambos tragam para o próximo encontro, músicas de sexo, isto é, sons ou músicas que lhes transmita algo sexual, seja relacionamento sexual, seja sensualidade.

Esse vídeo a Priscila me mandou, achei lindo e compartilho com vocês:
Na próxima segunda-feira, vamos dar continuidade a este processo e começar a trabalhar com as fotos que eu pedi para que trouxessem. Fotos escolhidas a partir das falas da cena 2. Qual objetivo disso? Que eles dêem significado a essas falas, que elas sejam uma construção deles e não apenas uma vocalização deles. Na realidade, a cena 2 já está construída no plano das idéias, a partir de idéias sugeridas por eles mesmos, só que não basta "mecanizar" as falas, eles precisam significá-las ou resignificá-las conforme suas experiências, sensos estéticos e expectativas artísticas.

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